A escola pública americana e seus encantamentos
Escrito por Rachel Botelho
A vida é feita de ciclo. E mais um ciclo na minha vida vem se fechando! Alguns vizinhos começaram a se mudar, presenciamos divórcios e casamentos. Chegamos com duas crianças e estamos saindo com dois pré-adolescentes. O nosso tempo em Los Angeles está se esgotando. Começo a rememorar sozinha esses anos em que aqui vivi com a minha família.
Hoje, especialmente, conversando com minha filha de 10 anos, pedi para que lembrasse dos momentos mais legais que vivenciou aqui. Não foi à ida Disney! Foi dentro da escola pública americana. Exponho as suas memórias na tentativa de mostrar como coisas simples e conexões positivas causam um impacto grande na vida escolar dos pequenos.
Ela me contou com muito carinho que adorava quando a professora do segundo ano, nos minutos finais da aula de sexta-feira, sentava-se no chão no tapete no fundo da sala para jogar com os as crianças. O jogo era uns flash cards com as perguntas do que foi aprendido na semana. Ela sorteava uma carta e a criança que levantasse a mão para responder e se acertasse a resposta ganhava uma borracha cheirosa, um lápis, adesivos ou livrinhos. A professora, com o seu sotaque de imigrante, sempre dizia na frente da minha filha “você pode, você consegue”. Acho que isso deu forças para a sua transição no novo país.
O dia do “Tudo” foi um dia que marcou o seu terceiro ano. Todas as sextas-feiras, as crianças assistiam a um filme em sala após o almoço. O dia do “Tudo” foi o último dia de aula, e o professor permitiu que os estudantes levassem as guloseimas preferidas para sala de aula para a sessão de filme. Imagino a festa com tanto cupcakes, biscoitos e batata chips.
Como me lembro do dia do cabelo enfeitado de cupcakes! No quarto ano, com objetivo de aumentar a frequência e o entusiasmo dos estudantes na escola, iniciaram o Spirit Week. Cada dia as crianças se apresentavam na escola de uma forma diferente. Um dia era com a camiseta do time preferido, outro dia era a cor da escola, no outro era com a camiseta do personagem preferido, noutro ir vestido de pijama ou com cabelo divertido. Confesso que criar um cabelo divertido foi muito legal. Depois de navegarmos juntas no Pinterest fizemos um cabelo de cupcake. Foi uma semana bem divertida! Minha filha adorava a professora. Segundo a minha pequena, essa professora era uma mulher com a personalidade forte. Sabia o que estava fazendo, mas o enfeite de cupcake amoleceu o seu coração naquele dia.
E a comemoração dos 100 dias de aula? Minha filha amava fazer os pôsteres dos 100 dias de escola. Imagina celebrar que 100 dias se passaram e que você aprendeu e brincou muito? Tem que festejar mesmo!!! Era muito divertido criar um pôster diferente para celebrar essa data. O corredor da escola ficava super coloridos, festivo e a vibração das crianças era eletrizante! Muita criatividade num local só! Não preciso te contar que fui socorrida pelo Pinterest de novo!
Memórias positivas sobre o evento do Halloween também apareceram na sua fala. Na verdade, ela gostava de se fantasiar com os personagens favoritos e depois criar cenas de acordo com os personagens no programa que havia na escola (After School Program). Nada de fantasias amedrontadoras! Nunca vi tanto super herói juntos! Era divertido ver as crianças fantasiadas com os seus personagens preferidos. Depois do desfile, ganhavam picolés! Era um Carnaval fora de estação com música dos Ghostbusters.
O programa pós-escola era a sua parte favorita. Fazia dever de casa e brincava. As turmas se uniam com os monitores que eram estudantes universitários. Jogos recreativos e artes eram as suas atividades favoritas. Voltava suando para casa!
Os projetos de ciências estão na lista de coisas preferidas. Não saíam de sala, mas uma vez a mesma professora do quarto ano trazia material diferenciado para fazerem projetos STEAM. Minha filha amava! Era a hora da mão na massa. Me contou que as aulas da Miss. M. eram um sucesso!
Contou-me com muito carinho sobre a estudante que a acompanhou nos primeiros meses na escola, a sua “buddy”. A professora nomeou uma colega de turma para ambientá-la na escola. A colega serviu de modelo para a minha filha entender as regras, os sistema escolar, ou seja, o funcionamento da escola. As duas acabaram se tornando grande amigas, como dizem por aqui best friends forever. Essa relação positiva, fez com que a minha filha também se tornasse buddy de outras crianças estrangeiras na sua sala.
Valeu à pena essa temporada por aqui. Tivemos altos e baixos como todos imigrantes que se aventuram a navegar em outros mares. Percebo na sua fala que coisas tão simples a impactaram de forma positiva, fazendo com que a escola se tornasse um lugar acolhedor e gostoso de frequentar, a ponto de não querer ir embora no final do dia. Foi na escola onde teve conexões positivas com os professores e colegas. E essas conexões na escola fizeram a temporada na Califórnia ser feliz. Obrigada, professores!
No término do nosso momento mãe e filha, ela me pergunta: – Como será a próxima escola? Estou curiosa…
Seguimos sendo uma família mundo afora! Abrindo e fechando ciclos.
Rachel é brasilense, mãe de duas crianças, uma delas tem o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista. Possui graduação em Pedagogia, Psicologia e pós-graduação em Neuropsicologia. Sempre trabalhou com Educação Especial na sua cidade natal. Já residiu em Washington e em Santiago do Chile, cidades onde seu filhos nasceram. Desde o início do ano de 2018 mora com sua família em Los Angeles. Adora fazer novas amizades, viajar em família, realizar trabalhos voluntários, ler livros, e fazer cursos na área de Educação Especial. Atualmente dedica-se à criação dos filhos e à sua formação profissional. Rachel gosta de compartilhar suas experiências maternas e inclusivas com outras famílias que possuem filhos com necessidades educativas especiais.